sábado, 7 de junho de 2008

Meu cabelo e a Copa de 98

Na copa de 1998, eu estava trabalhando e morando em uma cidadezinha no interior do Paraná, com cerca de 8.000 habitantes. É a típica cidade pequena, pacata e de povo muito fofoqueiro.

Durante toda a copa, eu fui uma fiel torcedora: com camisa da seleção, boné, faixa na testa, bandeira na mão... enfim, toda aquela loucura de torcedor fanático. Mas no último jogo, contra a França, eu endoidei de vez. Combinei com uma amiga (tão doida quanto eu) que nos pintaríamos de verde e amarelo.

Ela ficou responsável pelas bandeiras e faixas, e eu fiquei responsavel por comprar as tintas.

A princípio, minha idéia era nos pintar com tinta à base de água, a famosa GOUACHE. Mas aquela cidade era um ponto perdido no meio do nada e eu não encontrei a tal tinta em lugar nenhum. A única tinta "disponível no mercado" era a ACRILEX (aquela pra tecido); e em meio à minha obsessao de ficar verde e amarela, não achei relevante o fato dela nao sair com água...

Logo após o almoço, minha amiga foi para minha casa e eu a pintei. Um pouco mais discreta que eu, ela só quis uma bandeirinha no rosto e duas mechas no cabelo: uma verde e outra amarela. Já eu, que sempre fui extravagante, pintei três bandeiras no rosto (duas nas bochechas e uma na testa) e pedi para ela pintar um lado do meu cabelo de verde e o outro de amarelo.

Minha chefe, muito responsável, tentou impedir:
- Tem certeza do que tá fazendo? Essa tinta é emborrachada, não vai sair fácil assim...

Mas teimosa que sou, nem dei atenção. E assim minha amiga começou a pintar... Metade da cabeça verde, metade amarela. E eu estava me sentindo o máximo...

Quando o jogo começou, fomos com um grupo de amigos para a casa da minha amiga, felizes da vida.

Na metade do primeiro tempo, o rosto começou a queimar por causa da tinta e a cada dez minutos nós íamos ao banheiro ‘discretamente’ dar uma molhadinha, para aliviar a dor.

No segundo tempo, não conseguimos mais agüentar e tiramos a tinha do rosto. Aí veio o primeiro susto: Estávamos literalmente marcadas com a bandeira do Brasil. A pele havia queimado e a gente ficou com as bandeiras cicatrizadas no rosto. O pessoal, que já estava rindo do nosso fanatismo, caiu matando.

Quando foi chegando o fim do jogo, já estávamos desesperançosas, e decidimos ir ao banheiro lavar o cabelo antes do jogo terminar, para podermos sair com o pessoal sem passar muita vergonha.

Molhamos o cabelo, passamos o pente, shampoo, lavamos a cabeça... e não saiu nada. Nadinha. O jogo acabou, o pessoal saiu e nós ainda estávamos no banheiro, esperançosas de que nas próximas horas conseguiríamos arrancar toda a tinta.

Mas as horas se passaram e nada.

Voltei para casa 01:00 da madrugada, perdi a festa com o pessoal e estava desconsolada. Mas no fundo, eu tinha certeza que se passasse a noite toda acordada, lavando o cabelo, a tinta sairia. Pura ilusão. Passei a madrugada inteira lavando a cabeça e nada. Passei o domingo todo lavando o cabelo e nada. Meus pentes e minhas escovas ficaram cheios de tinta verde e amarela... Mas o meu cabelo não desbotou nem um pouquinho.

Na segunda-feira tive que voltar ao trabalho e fui dar aula. Meus alunos eram, na maioria, adolescentes e 'adoraram' a novidade: uns me apelidaram de “Periquita Verde”, outros me chamavam de "Mascote da Seleção"... Para eles, foi um prato cheio. Pelas ruas da cidade, onde eu passava as pessoas quebravam o pescoço para olhar minha cabeça. E eu podia ouvi-los rindo, sorrateiramente.

Passei a semana toda tentando tirar a tinta. Minha amiga desistiu de tirar a tinta e simplesmente cortou as mexas. Na semana seguinte ela foi para os Jogos Escolares em outra cidade e quando as pessoas perguntavam o que ela tinha no rosto, ela dizia que tinha se machucado.
- Que incrível – diziam. – Parece a bandeira do Brasil...

Ela saiu em todas as fotos com a bandeira marcada no rosto. Quanto ao cabelo, ela só ficou uma falha na cabeça, mas nada muito grave...

Já eu... meu problema era grande!

Quando chegou a sexta-feira, eu fui para a minha cidade e marquei um horário numa cabeleireira. Ela cortou meu cabelo (que era abaixo dos ombros) no tamanho ‘chanel’ (para ficar mais fácil de tirar a tinta). Na hora de escolher a cor, eu, discretíssima como sempre, escolhi vermelho. Ela descoloriu meu cabelo, tirou a tinta verde e amarela, pintou... e meu cabelo ficou LARANJADO.

L - A - R - A - N - J - A - D - O mesmo. Laranjado. Laranjado da cor da tampa da maionese Hellman’s. Extremamente laranjado.

Tudo bem que eu gostava de chamar a atenção... mas aí já era demais... demais até pra mim.

Eu sentei na cadeira de novo e disse:
- Ah... me desculpa, mas eu não saio daqui assim não...

Então ela descoloriu meu cabelo novamente e pintou de novo. Mais uma vez eu achei que ficaria bom... Mas quando secou, meu cabelo ficou metade cobre, metade marrom. Teria ficado legal, se tivesse sido feito de propósito.

Desisti. Fui embora pensar no que faria.

Na Segunda, voltei para a cidade em que trabalhava. Quando cheguei na escola, meus alunos caíram na risada: agora me chamavam de “Tigelinha”. Não os culpo. Parecia mesmo que eu estava com uma tigela na cabeça.

A situação ficou tão desesperadora que eu, que nunca havia tido cabelos curtos, decidi corta-los bem curtinho. Num tamanho bem curto, não apareceria a cor de baixo, assim estaria resolvido meu problema. Não era tão ruim assim, afinal, cabelos crescem de novo.

Fui na cabeleireira (outra, claro!), sentei na cadeira, tirei os óculos e pedi que ela cortasse meu cabelo bem curto. Ela cortou, cortou... e eu, sem óculos, olhando da cadeira, mandei ela cortar mais - eu queria que meu cabelo ficasse como o da Fátima Bernades -.

Ela cortou, secou e quando eu coloquei os óculos para ver como havia ficado... eu quase desmaei. Não porque meus cabelos estavam muito curtos - o fato era que eu simplesmente não tinha mais cabelo!

Parecia que ela havia passado máquina 4 na minha cabeça.

Fiquei desconsolada.

Foi tão grave que quando cheguei no trabalho do meu pai, nem ele me reconheceu.

Mas resolvi olhar pelo lado bom: pelo menos agora não me chamariam de 'Periquita Verde', nem de 'Tigelinha'. O máximo que aconteceria seria as pessoas se assustarem um pouco... mas nada muito grave.

Então voltei ao meu trabalho. Eu estava confiante, afinal, que apelido eles poderiam me dar?

Eu entrei na sala de aula e o primeiro aluno chegou. Ele ficou olhando para mim intrigado, assim como todos os outros que chegaram logo depois, mas todos ficaram sérios e em silêncio.

Foi melhor do que eu imaginei - eu pensei comigo mesma.

Até que todos chegaram e quando eu ia começar a aula, um aluno me chamou, ficou me encarando um bom tempo e depois, com um olhar muito sério, me perguntou:

- A senhora agora vai servir o exército??

E foi só nesse momento desesperador que alguns alunos se jogaram no chão e todos desembestaram a rir...

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By Gisa